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Comunicar na Administração Pública

Comunicar na Administração Pública é sempre diferente. Diferente porque o propósito não é comercial, porque os temas e a construção de mensagens devem ser tratados numa perspetiva de interesse público.

27 Dezembro 2021

N.º 13 Diagrama - dezembro 2021 administração pública comunicação

Comunicar na Administração Pública é sempre diferente. Diferente porque o propósito não é comercial, porque os temas e a construção de mensagens devem ser tratados numa perspetiva de interesse público, porque os recursos são outros e porque o público é de difícil caracterização e, por vezes, universal. Mas é também diferente porque pode e deve ser bem mais desafiante e, consequentemente, gratificante!

 

Publicitar ou consciencializar

Será que existem diferenças? Publicitamos junto das pessoas ou consciencializamos cidadãs e cidadãos para o recurso à informação e soluções que lhes facilitem o dia a dia? De um ponto de vista linguístico, é efetivamente diferente: publicitar pode ter um sentido propagandista, colado ao proveito na perspetiva do promotor da informação, e não obrigatoriamente focado no interesse do beneficiário. Já consciencializar implica comunicar com o simples propósito de divulgar, sensibilizar para dar a conhecer informação que pode ser relevante para quem a consome. Pois, «consome», é aqui que começa a mescla: Comunicar serviços públicos não obedece à lógica de vendas de produto assente numa relação vendedor/consumidor. Mas voltando à questão: é de facto diferente linguisticamente, mas sobretudo na abordagem por parte de quem produz conteúdos, para um ou outro fim. Comunicar no Estado deve ser feito com esta premissa presente. Ainda assim, não deve ser limitador da criatividade, da qualidade dos conteúdos e dos modelos, e muito menos justificação para a inexistência de comunicação.

 

A finalidade e o público obrigam a uma abordagem muito própria, mas em tudo o resto, desde a escolha dos meios de comunicação à qualidade da informação, ao cuidado das peças e materiais, as coisas confundem-se ou deveriam confundir-se!

 

A Administração Pública, na sua generalidade, não tem por hábito, infelizmente, trabalhar a informação com o cuidado que se impera para um público que recorrentemente é alargado.

 

Não faz sentido o Estado não ter meios de qualidade para chegar junto das pessoas - os destinatários da informação -, independentemente do propósito, seja ele publicitar ou consciencializar. Temos produtos e serviços, de que são exemplo a Chave Móvel Digital, o ePortugal, id.gov.pt, o Programa Simplex, as Lojas e Espaços Cidadão ou mesmo o primeiro orçamento participativo à escala nacional do mundo - o OPP -, que são, todos eles, bons casos de estudo e premiados internacionalmente. São, acreditamos, produtos reconhecidos pela sua qualidade e utilidade, eventualmente por uma ou outra campanha a eles associada ou, por fim, pela utilização necessária para a realização de uma ou outra obrigação junto do Estado.

 

No entanto, nenhuma destas marcas beneficia de uma comunicação com o alcance que deveria, pela simples razão de os meios ao dispor para essa mesma comunicação não poderem ser equiparados aos de qualquer campanha de um produto privado de escala. Poderá dizer-se que não há essa necessidade, porque são de serviços do Estado, com os quais, de uma ou outra forma, nos teremos que deparar para cumprir uma qualquer obrigação. Não acreditamos que seja assim, pois o caminho percorrido entre a entrada em produção e a adoção em larga escala é penoso e, muitas vezes, prejudica a sua própria curva evolutiva, porque, afinal de contas, o que não se conhece… não existe. Ou melhor: o que demora a ser conhecido tem uma curva de adoção que, por vezes, dificulta a própria evolução do produto.

 

As marcas

As marcas devem existir para diferenciar produtos. Não são - ou não devem ser - um mero cunho gráfico ou nome de código colado a um produto, uma imagem para assinalar a realização de uma política pública ou para dar apenas sustento à apresentação de uma solução. As marcas são um investimento contínuo, cujo propósito é identificar e distinguir soluções e serviços, que promovem uma identidade e distinguem um produto. São um instrumento de comunicação cujo propósito é designar e identificar visualmente uma solução, para que, do reconhecimento, resulte uma vantagem para os destinatários. A inversão deste princípio, adotando marcas e siglas para toda e qualquer solução, é um dos maiores problemas do Estado, cujos sítios físicos e na internet se tornam constantemente em montras de pequenos logos que em nada ajudam na perceção da informação, na identidade de um produto ou, por fim, na própria adoção e boa utilização de um serviço.

 

As marcas são identidade, a identidade serve para identificar e identificar é reconhecer o singular. Tudo o que não se encaixa nesta lógica não deveria ser uma marca, mas tão só um serviço associado a um produto. Mais do que isto, é confundir. Investir numa marca ou na comunicação de um produto de consumo tem um retorno mensurável, normalmente calculado através de vendas. Calcular o impacto no setor público é bem mais complexo, porque o lucro não está, normalmente, no lado do promotor, mas sim do beneficiário. Conseguimos facilmente saber qual o retorno da promoção de um refrigerante, subtraindo o investimento em comunicação ao lucro resultante do aumento de vendas, somado à vindoura notoriedade da marca. No setor público não são estas as contas: há que medir, ou pelo menos tentar ter uma noção real, do benefício para quem evita deslocações, simplifica processos, poupa tempo, meios e recursos.

 

 

O público, os meios e os canais

Dez milhões de pessoas não são, seguramente, o público-alvo de toda e qualquer comunicação dos serviços do Estado. Ainda assim, trata-se normalmente de comunicação à escala nacional e com um público alargado, o que com frequência dificulta a melhor abordagem. É seguramente mais simples trabalhar a comunicação para nichos — porque tendem a usar a mesma linguagem e a recorrer aos mesmos canais — do que chegar a um grande universo à escala nacional.

 

Quando almejamos chegar a todos, temos de ter presente que habitualmente são públicos que se enquadram em escalões etários e sociais diferentes, com atividades distintas, de geografias diversas e consumidores ou frequentadores de meios, redes e plataformas diferentes. Ainda assim, tende a existir uma vantagem: a informação de escala e de claro interesse público é suficientemente apelativa para ser tratada e divulgada pelos órgãos de comunicação tradicionais, sem que haja um investimento em campanhas associado. Ainda assim, e assumindo que qualquer informação tem sempre um público caracterizável, é essencial definir destinatários, saber onde os encontrar e comunicar através dos meios ajustados, de acordo com o propósito.

 

A definição de públicos e a escolha de meios estão, sempre, relacionadas. Definir quem queremos alcançar é essencial, não apenas para definir mensagens e estilos, mas também, e cada vez mais, para escolher os meios. Há alguns anos falávamos de meios tradicionais: jornais, televisão, rádio ou suportes de interior ou de exterior. No máximo, definiam-se horários para passagens ou escolhíamos publicações especializadas. Hoje é muito mais complexo e constantemente dinâmico. O digital, na generalidade, e as redes sociais, em especial, permitem uma imensidão de opções. Devem ser considerados períodos de publicação, tipos de informação e de suporte - multimédia ou outros -, zonas geográficas, formas de disseminação, faixas etárias e sociais, caracterização e definição de perfis de públicos e mais um sem número de definições que, em muito, impactam no alcance das mensagens. Mas não é o único desafio dos novos tempos: há a constante e necessária atualização dos formatos e soluções que a tecnologia permite, bem como da escolha das plataformas, também altamente dinâmicas. Fazer um pequeno filme - story - com recurso a equipamentos comuns para uma rede não é forçosamente uma boa escolha e o formato poderá ter de ser diferente numa outra. Divulgar um direto através do YouTube e partilhar no Facebook não é, tecnologicamente e no impacto, a mesma coisa que efetuar partilhas diretas através de todas as redes. Hoje lemos na diagonal, somos retidos pelo olho, cativados pelo interesse, mas acima de tudo navegamos em função das nossas necessidades pontuais. Retemos o que o olho vê… mas mergulhamos na informação, mais ou menos detalhada, em função das nossas necessidades esporádicas.

 

Mas há mais e o Estado tem outra ferramenta: não é apenas o maior detentor de público, é também o maior detentor de meios. Por meios devemos entender os espaços de atendimento, físicos ou online, mas também os meios a que ninguém liga coisa nenhuma, como são outros edifícios, operadores de transportes, páginas de serviço online e mesmo espaços públicos.

 

Tirar proveito, de forma criativa e não intrusiva, garantindo que a informação chega a quem dela necessita, através desta tremenda rede de meios, é fazível.

 

 

Os novos tempos

Comunicar em escala, hoje, está ao alcance de todos. Daí a concluir que todos sabemos trabalhar a comunicação de forma correta, substantiva e objetiva é que é um erro.

 

Por outro lado, e também fruto da imensidão de conteúdos que nos passam pelos olhos diariamente, tendemos a filtrar informação em função das nossas necessidades pontuais. Não perdemos tempo com o que não nos é relevante num determinado momento, porque sabemos que através de um motor de pesquisa, acessível através de qualquer dispositivo, podemos, quando necessário, aceder à informação, no momento em que ela nos é relevante. Aí, e cada vez mais, o importante é que essa informação esteja acessível, seja clara e focada nas necessidades de quem a procura.

 

Estes novos tempos e estas novas formas de aceder a informação em função das necessidades obrigam-nos a uma separação da comunicação. Comunicação ativa, que requer promoção, conteúdos dinâmicos e em diferentes suportes e plataformas, e comunicação passiva, que não é mais do que o garante de que os conteúdos estão no sítio certo, formatados corretamente, com uma linguagem acessível, de fácil acesso, ao alcance imediato, de acordo com necessidades ocasionais.

 

A tecnologia ajuda, as redes ajudam. Tudo é mais imediato! Ainda assim, não é tarefa para quem simplesmente domina as tecnologias e as redes, porque não são estas tecnologias, nem qualquer algoritmo, que dominam o impacto e o propósito de cada palavra, a forma como reagimos a cores, ajustamos formatos ou assimilamos as mensagens e retemos os conteúdos.

 

A acessibilidade e usabilidade, hoje tão importantes, também se aplicam à comunicação.

 

 

A estratégia e as métricas

Criar uma marca passa por conhecer um produto pormenorizadamente, entender e prever a sua evolução e o seu alcance, identificar e caracterizar o público, tentar antever os níveis de adoção e, com base em tudo isto, definir toda uma estratégia. E toda uma estratégia passa por, tendo em consideração todos os fatores referidos, definir objetivos, desenhar uma identidade, associar mensagens, identificar meios, produzir peças, definir um orçamento e investir. Mas não chega e não é aqui que o círculo fecha. Há que medir e realizar o não menos importante processo de constante monitorização. Os ajustes que decorrem das evoluções do produto, do alcance da marca e dos níveis de adoção, que só são possíveis através da definição de métricas e análise de resultados, para ter a perfeita noção do impacto e, consequentemente, fazer eventuais ajustes que garantam o cumprimento dos objetivos.

 

 

Comunicação compensadora

Ainda assim, e com todas as especificidades de que a comunicação no setor público sofre, dos imensos desafios decorrentes do facto de partirmos de uma quase inexistente comunicação de qualidade e minimamente articulada, comunicar no Estado é tremendamente compensador e gratificante. Afinal de contas, trata-se de serviço público, nobre, com o propósito de ajudar cidadãos e empresas a terem um dia a dia mais simplificado, muitas vezes livre de custos de contexto desnecessários. Toda uma lógica, também na comunicação, de ver, no outro lado, pessoas que, de uma forma ou de outra, beneficiam do grande esforço que tem sido feito para que o setor público seja uma referência na prestação de serviços e na agilização de processos. Mais: sem a lógica concorrencial, agressiva e muitas vezes pouco ética de que a comunicação de produtos de consumo tradicionais sofre.

 

António Cruz | Direção de Comunicação — AMA, IP

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